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Projeto recupera 112 hectares de áreas degradadas na ESEC Raso da Catarina, na Bahia
Desde que começou a ser implementado em 2021, o projeto “Restauração da Biodiversidade da Estação Ecológica (ESEC) Raso da Catarina” centra esforços para recuperar a vegetação nativa no interior e no entorno da Unidade de Conservação (UC) baiana. O sucesso na execução do projeto, sob a batuta da Assessoria e Gestão em Estudos da Natureza, Desenvolvimento Humano e Agroecologia (Agendha), deve-se a duas ações-chave: recuperar áreas degradadas pela ação humana e implantar um viveiro de mudas nativas da Caatinga para apoiar o trabalho de restauração.
A primeira ação passa por recuperar 112 hectares da Mata da Pororoca — ou Mata dos Paus Grandes, como também é conhecida — no interior da UC. Toda a área foi cercada recentemente com arames, mourões e estacas de eucalipto tratado para isolar os fatores de degradação e facilitar a regeneração natural em 11 hectares da mata. Ainda, foram realizadas ações de regeneração induzida em 46 hectares, com plantio de mudas e sementes de Caatinga e manejo da vegetação nativa e de espécies invasoras. Em outros 55 hectares, foi realizada a implantação de técnicas para a melhoria do solo e da água.
O cercamento limita o pastoreio livre, a passagem de rebanhos de gado bovino e a entrada de vaqueiros e caçadores. Nos meses mais quentes e sem chuvas, contribui para reduzir que eventuais queimadas iniciadas por pecuaristas para “renovar pastos” avance sobre a vegetação nativa e cause incêndios florestais.
“É nesse cenário que se compreende a importância do cercamento realizado, que assegura a manutenção da fauna e flora na ESEC Raso da Catarina, além de sua exuberância e beleza. Recuperar áreas degradadas, mesmo em pequena escala, significa um grande passo para a nossa geração e a conservação para as que virão”, diz o coordenador-geral do projeto pela Agendha, Maurício Aroucha.
A segunda ação-chave do projeto é a implantação do Viveiro de Mudas da Sociobiodiversidade, das Caatingas e dos Cerrados. O viveiro nasceu com a meta de produzir 100 mil mudas de espécies nativas para abastecer os esforços de restauração na estação ecológica e em áreas de povos e comunidades tradicionais, extrativistas e de famílias de pequenos agricultores assentadas no entorno. Entre as espécies produzidas estão orelha-de-burro, pororoca, lianas, aroeira, mulungu, embiratanha, umbuzeiro, cajueiro, atinha, pinha-brava, alamanda-roxa, pereiro, jacarandá-mimoso, buquê-de-noiva, caroá e mez.
As duas ações-chave do projeto contribuem para o desenvolvimento rural sustentável, recuperam áreas degradadas pela ação humana e impactam positivamente a vida de comunidades no encontro da estação ecológica. Também, promovem a inclusão socioprodutiva de agricultores familiares.
Sinergia entre iniciativas locais
A união de forças com outras iniciativas locais para recuperar a vegetação nativa marca a atuação do projeto. A sinergia com o projeto ATER Agroecologia possibilita a aproximação com povoados no entorno da estação ecológica.
A agricultora familiar Joelma Teixeira Lima, de Campos Novos, em Paulo Afonso (BA), município vizinho à UC, conta que o fornecimento de mudas nativas ajuda não apenas a recuperar áreas de Caatinga devastadas, como também contribui para a produção de alimentos e proporciona acompanhamento técnico à comunidade.
“Recebemos muitas dicas de como trabalhar com a terra, como proteger o solo e adubar nossas plantas. Na minha roça, tenho árvores frutíferas, que consigo comercializar no tempo da chuva, como caju, umbu, licuri e laranja”, destaca. Joelma plantou espécies medicinais, de usos múltiplos e frutíferas, com predominância de nativas da Caatinga.
Graças à relação entre a Agendha e a Regional Nordeste, do MST, foram firmadas parcerias com ênfase na participação feminina que viabilizam a entrega de mudas a pequenos agricultores de assentamentos. Além de contribuir com a recomposição florestal e a recuperação da biodiversidade local, o plantio das mudas gera benefícios para as famílias, que passam a ter na colheita futura fonte de alimentação e renda.
“Nossa maior preocupação são com as ordens de despejo. O que mantém a gente na terra é o compromisso em cultivar e fazer nossa colheita. A doação de mudas nativas da Caatinga de plantas frutíferas e ornamentais (para jardins) é muito importante para nossa militância, para manter a produtividade e para a natureza”, conta Aline Silva, uma das coordenadoras.na Brigada Velho Chico, em Paulo Afonso (BA).
ESEC Raso da Catarina
A Caatinga é o único bioma 100% brasileiro, ocupando quase 11% do território nacional. A vegetação é dominada por árvores de folhas pequenas e com caules retorcidos ou com espinhos, como o mandacaru. As espécies evoluíram adaptadas a um ambiente de chuvas irregulares e secas prolongadas.
A Caatinga também é uma das regiões semiáridas mais densamente povoadas do planeta, onde vivem cerca de 27 milhões de pessoas. Há milênios, populações humanas convivem com a escassez hídrica, elaboram estratégias para garantir o consumo de alimentos e acumulam conhecimentos e saberes tradicionais e locais para conviver no bioma.
O Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) estima que 80% dos ecossistemas originais já foram alterados na Caatinga. Ainda assim, pouco mais de 2% do bioma é composto de UC de proteção integral, mais restritivas à intervenção humana, como é o caso das estações ecológicas.
Esse cenário dá a dimensão da importância da ESEC Raso da Catarina, que tem 105 mil hectares e está localizada entre os municípios baianos de Ibipeba, Gentio do Ouro e Xique-Xique.
Vivem no entorno povos e comunidades tradicionais, como quilombolas e indígenas, e famílias de pequenos produtores rurais assentados, que desenvolvem atividades de subsistência.
O entorno da estação ecológica é marcado pela presença de áreas degradadas pela intervenção humana, fragmentação dos habitats nativos e ameaça por queimadas. Dentro da UC, a ação humana exerce pressão pela caça ilegal, exploração irregular da madeira e pressão para conversão do solo para cultivo agrícola ou criação de gado.