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Pantanal: o desafio da prevenção e da restauração em meio às chamas
Na primeira semana de agosto, enquanto parte do Pantanal voltava a sofrer com incêndios de grandes proporções e ocupava as notícias no Brasil todo, na Serra do Amolar, no Mato Grosso do Sul, o Coronel Ângelo Rabelo fazia articulações para combater as chamas. São 22 anos à frente do Instituto Homem Pantaneiro, que desde 2021 recebe recursos do projeto GEF Terrestre para o trabalho de prevenção do fogo e de restauração do bioma.
“A força da natureza impôs a necessidade de diálogo”, explica Rabelo ao lembrar dos incêndios de 2020.
Seu rádio comunicador está a postos para receber demandas de combate, e com olhar atento à beira do Rio Paraguai, Rabelo dava comandos assertivos também para os ribeirinhos, no percurso de 6 horas de Corumbá à Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) Acurizal.
Desde 2020, o fogo é uma das suas principais preocupações. Segundo dados do Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais (LASA), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) de janeiro a agosto de 2024, o fogo atingiu mais de 10% do Pantanal, o que representa 1,533 milhão hectares. Por isso, Rabelo destaca a importância da Brigada Alto Pantanal apoiada pelo GEF Terrestre.
“Os recursos trouxeram estabilidade para o trabalho dos brigadistas. E é um trabalho que vai muito além do fogo. Eles são agentes de educação ambiental nas comunidades da Serra do Amolar, isso também é um trabalho de prevenção”, conta ele.
Nos meses de julho e agosto, a Brigada tem atuado em conjunto com agentes públicos como os do PrevFogo, do IBAMA.
Manoel Garcia, chefe da Brigada Alto Pantanal, forma um time com mais cinco homens que entregam todos seus sentidos por um propósito presente e futuro.
“A gente não está trabalhando por nós e sim pelos nossos filhos. E pelo Pantanal que queremos deixar para eles”, diz ele.
Deixar a família e passar dias, semanas na região da Serra do Amolar não é tarefa fácil. Desde 26 de julho eles estavam longe de casa. E até 12 de agosto permaneceram ativos e atentos para o monitoramento do fogo. A frente fria que entrou no Mato Grosso do Sul, em 8 de agosto, ajudou a amenizar os estragos das chamas. Mas a prevenção para eles é o que faz o trabalho ter sentido.
“É bom estarmos na região e de forma permanente. Se fôssemos esperar virem equipes de Corumbá, não ia dar tempo. O fogo é ligeiro. O tempo e o clima mudaram”, explica Manoel, que fica na base do IHP em Serra Negra, durante o tempo de combate, a 3 horas e 30 minutos de barco de Corumbá.
O maior desafio, além das escalas ininterruptas, do calor intenso e da devastação de fauna e flora que eles têm de se deparar, está entre seus conterrâneos.
“A mentalidade das pessoas é o mais difícil de mudar. Continuam fazendo o ‘vermelhão’, que é o modo como o povo da região do Amolar chama o fogo. Não é por falta de conversa. Falamos nas comunidades que não é o momento de tocar fogo”, conta Manoel, pois o período da seca chegou em junho antes do previsto para agosto e o fogo veio junto.
Manoel, tal qual o poeta mais famoso do Pantanal, o de Barros, é amante convicto dessas terras. E não arreda o pé dos locais onde o fogo está, faça chuva, faça sol, frio ou calor.
“A gente não descansa enquanto não tiver resolvido. O fogo não termina quando apaga. Há um protocolo de 72 horas de rescaldo. Percorremos toda a área de combate para ter certeza que não há mais sinal de fogo”, explica ele.
Restaurar para conservar
Além da conscientização do pantaneiro, Rabelo tem um sonho que lhe move há mais de 20 anos: ser uma ponte entre o Pantanal e o mundo. Para isso continuar a acontecer a restauração florestal é a aposta do IHP. Implementados com recursos do GEF Terrestre, a organização mantém três viveiros de espécies nativas do bioma que já foram introduzidas em 15 hectares na RPPN Acurizal, também atingida pelos incêndios de 2020. Para o desenvolvimento do projeto “Mitigação dos efeitos dos incêndios de 2020 e prevenção contra novos incêndios na Serra do Amolar, Pantanal”, a organização conta com Cristiane dos Santos, técnica de campo, que coordena esse processo de restauração desde o início, em dezembro de 2021.
“Tem que ter muita paciência e amor. É um acompanhamento intenso e de perto. Quando as mudas saem dos viveiros, elas vão usufruir de um espaço onde estarão integradas aos animais e a outras plantas. Pode parecer uma área pequena. Mas os animais que passam na área do plantio são dispersores de sementes e fazem essa área de restauração ser muito maior”, conta ela.
Moradora da base do IHP na RPPN Acurizal, Cristiane sente orgulho de ser a “mãe” das mudas e com seus 1m55cm de altura reconhece a grandeza do seu trabalho.
“Você vê que faz um bem não só para as plantas, mas também para os animais e para o Pantanal como um todo”, diz ela com um sorriso de missão cumprida.