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Extrativistas, quilombolas e produtores se reúnem para elaborar um Protocolo Biocultural do Baru e discutir boas práticas de manejo e comercialização da castanha
Os modos de vida dos povos e comunidades tradicionais do Cerrado são profundamente conectados com a terra e suas riquezas naturais. Com um conhecimento ancestral sobre o bioma, essas comunidades preservam práticas sustentáveis que garantem não apenas sua subsistência, mas também a conservação desse bioma único. No entanto, a crescente expansão da agricultura industrial tem imposto ameaças cada vez mais agressivas sobre seus territórios, resultando na perda de biodiversidade e na degradação socioambiental, levando muitas comunidades ao abandono de seus territórios. Nesse cenário desafiador, entre os dias 23 e 28 de setembro de 2024, em Brazlândia, ocorreu o 2º módulo do Formar Baru, Formação Continuada em Cadeias de Valor Inclusivas do Cerrado.
Realizado pelo IEB em parceria com a Associação Quilombo Kalunga (AQK) e a CooperFrutos do Paraíso, o evento contou com a participação de produtores rurais, extrativistas, quilombolas e assentados vindos de diferentes regiões de Goiás, como Alto Paraíso, Monte Alegre, Cavalcante, Teresina de Goiás, além de Minas Gerais e Mato Grosso do Sul.
2º módulo do Formar Baru: construção coletiva de saberes e práticas
Enquanto o primeiro módulo do Formar Baru abordou a “Introdução às Cadeias Produtivas Sustentáveis do Cerrado e seus Povos”, o segundo módulo avançou nas discussões sobre Salvaguarda, Boas Práticas e o Protocolo de Manejo do Baru. O principal foco foi a criação participativa de um Protocolo Comunitário Biocultural, um instrumento essencial que estabelece diretrizes de boas práticas para o uso sustentável do baru, valorizando os saberes tradicionais e protegendo as comunidades das pressões externas. Além disso, foi ampliado o debate sobre a geração de renda sustentável para os povos do Cerrado.
Andreia Bavaresco, coordenadora do projeto Baru da Chapada trouxe no primeiro dia do evento uma fala impactante:
“Estamos em um momento alarmante em relação às catástrofes climáticas. Quem menos contribui é quem mais sofre com essas mudanças, e isso tem nome: racismo ambiental. Desde grandes pajés como Davi Kopenawa até cientistas como Carlos Nobre estão assustados com o cenário devastador que estamos vivendo. Os eventos climáticos que estão por vir não serão fáceis, e é por isso que estamos aqui juntos: para pensar no nosso futuro. Os conhecimentos tradicionais já trazem soluções para muitos dos problemas que enfrentamos. Vamos reunir esses saberes para propor ideias, soluções e planos para lidar com o presente e o futuro. E eu digo uma coisa: tirar o sustento da natureza, se manter firme e ter qualidade de vida no próprio território já é uma medida poderosa para enfrentar as mudanças climáticas. Isso é revolucionário.”
Bianca Lima, coordenadora do Programa Povos do Cerrado do IEB, também destacou em sua fala a importância dos temas abordados no segundo módulo da formação:
“Esse módulo trouxe a discussão para a base, para o chão. A visita à propriedade da Dona Ana e do Seu Zillas foi uma experiência muito importante que conectou os cursistas à realidade que eles vivem em seus territórios. A gente andou pelo Cerradão, coletou e quebrou baru, discutiu o beneficiamento… O que vimos ali foi um design de sistema produtivo muito interessante, mostrando na prática como planejar e organizar quintais e terreiros de forma rentável e sustentável. Cada etapa da produção ali foi uma oportunidade para observar o que outras pessoas já estão fazendo. Entender o que funciona em diferentes contextos, trocar experiências, tudo isso é fundamental.”
Além disso, Bianca ressaltou como ficou evidente a forte conexão cultural de muitos povos do Cerrado com o baru e os frutos da sociobiodiversidade, apontando que “eles não estão presentes apenas na comercialização, mas também na vida cotidiana, na culinária nos torneios de futebol e também nas festas tradicionais.”
O 2º módulo contou também com a participação de três facilitadores convidados, que trouxeram abordagens complementares para enriquecer a formação. Laércio Meirelles, agrônomo e agroecologista, ministrou aulas sobre a “Organização Social da Produção e Territórios de Uso Comum” abordando a história dos movimentos sociais, o surgimento de associações, cooperativas e a importância das feiras no fortalecimento de organizações sociais. As feiras, segundo o professor Laércio, vão além de um simples espaço de comercialização:
“A feira não é só um espaço de venda, mas também de articulação social. É nela que encontramos nossos companheiros, conversamos sobre o que está acontecendo na roça, sobre acertos, erros e dificuldades… E a feira precisa de cuidado, viu? Feira que a gente não cuida tende a esmorecer”
Para ele, esses espaços são muito importantes na promoção da organização social, propícios ao fortalecimento comunitário e cooperação.
Gisele Ferreira, 19 anos, cursista do Formar Baru e membro do Centro de Produção, Pesquisa e Capacitação do Cerrado (Ceppec), compartilhou a sua visão:
“Muita gente me pergunta se eu tenho vergonha de ir para a feira… mas eu sinto o contrário. Eu amo. Eu tenho orgulho de ir para a feira, de trabalhar com alimentos saudáveis e de ajudar a preservar a natureza. Tenho muito orgulho do meu trabalho.”
Outros professores convidados foram Luis Carrazza, secretário executivo da Central do Cerrado, que conduziu uma aula prática sobre as boas práticas de manejo e o uso do baru, levando os participantes a um baruzal para demonstrar as etapas de coleta, beneficiamento e armazenamento do fruto.
Além disso, Flávia Aguiar, comunicadora, fundadora e locutora do programa Beira Mundo da Rádio Cultura, ofereceu uma oficina criativa de vídeos curtos, incentivando os participantes a contarem suas próprias histórias e tradições por meio da produção audiovisual. Essas contribuições somaram conhecimento técnico e cultural ao módulo, reforçando a conexão entre a prática, a gestão territorial e a valorização das identidades locais. A seguir, você poderá assistir a um pequeno vídeo produzido pelos cursistas do Formar Baru após a oficina com Flávia, mostrando algumas atividades da formação.
Os modos de vida dos povos e comunidades tradicionais do Cerrado são profundamente conectados com a terra e suas riquezas naturais. Com um conhecimento ancestral sobre o bioma, essas comunidades preservam práticas sustentáveis que garantem não apenas sua subsistência, mas também a conservação desse bioma único. No entanto, a crescente expansão da agricultura industrial tem imposto ameaças cada vez mais agressivas sobre seus territórios, resultando na perda de biodiversidade e na degradação socioambiental, levando muitas comunidades ao abandono de seus territórios. Nesse cenário desafiador, entre os dias 23 e 28 de setembro de 2024, em Brazlândia, ocorreu o 2º módulo do Formar Baru, Formação Continuada em Cadeias de Valor Inclusivas do Cerrado.
Realizado pelo IEB em parceria com a Associação Quilombo Kalunga (AQK) e a CooperFrutos do Paraíso, o evento contou com a participação de produtores rurais, extrativistas, quilombolas e assentados vindos de diferentes regiões de Goiás, como Alto Paraíso, Monte Alegre, Cavalcante, Teresina de Goiás, além de Minas Gerais e Mato Grosso do Sul.
2º módulo do Formar Baru: construção coletiva de saberes e práticas
Enquanto o primeiro módulo do Formar Baru abordou a “Introdução às Cadeias Produtivas Sustentáveis do Cerrado e seus Povos”, o segundo módulo avançou nas discussões sobre Salvaguarda, Boas Práticas e o Protocolo de Manejo do Baru. O principal foco foi a criação participativa de um Protocolo Comunitário Biocultural, um instrumento essencial que estabelece diretrizes de boas práticas para o uso sustentável do baru, valorizando os saberes tradicionais e protegendo as comunidades das pressões externas. Além disso, foi ampliado o debate sobre a geração de renda sustentável para os povos do Cerrado.
Andreia Bavaresco, coordenadora do projeto Baru da Chapada trouxe no primeiro dia do evento uma fala impactante:
“Estamos em um momento alarmante em relação às catástrofes climáticas. Quem menos contribui é quem mais sofre com essas mudanças, e isso tem nome: racismo ambiental. Desde grandes pajés como Davi Kopenawa até cientistas como Carlos Nobre estão assustados com o cenário devastador que estamos vivendo. Os eventos climáticos que estão por vir não serão fáceis, e é por isso que estamos aqui juntos: para pensar no nosso futuro. Os conhecimentos tradicionais já trazem soluções para muitos dos problemas que enfrentamos. Vamos reunir esses saberes para propor ideias, soluções e planos para lidar com o presente e o futuro. E eu digo uma coisa: tirar o sustento da natureza, se manter firme e ter qualidade de vida no próprio território já é uma medida poderosa para enfrentar as mudanças climáticas. Isso é revolucionário.”
Bianca Lima, coordenadora do Programa Povos do Cerrado do IEB, também destacou em sua fala a importância dos temas abordados no segundo módulo da formação:
“Esse módulo trouxe a discussão para a base, para o chão. A visita à propriedade da Dona Ana e do Seu Zillas foi uma experiência muito importante que conectou os cursistas à realidade que eles vivem em seus territórios. A gente andou pelo Cerradão, coletou e quebrou baru, discutiu o beneficiamento… O que vimos ali foi um design de sistema produtivo muito interessante, mostrando na prática como planejar e organizar quintais e terreiros de forma rentável e sustentável. Cada etapa da produção ali foi uma oportunidade para observar o que outras pessoas já estão fazendo. Entender o que funciona em diferentes contextos, trocar experiências, tudo isso é fundamental.”
Além disso, Bianca ressaltou como ficou evidente a forte conexão cultural de muitos povos do Cerrado com o baru e os frutos da sociobiodiversidade, apontando que “eles não estão presentes apenas na comercialização, mas também na vida cotidiana, na culinária nos torneios de futebol e também nas festas tradicionais.”
O 2º módulo contou também com a participação de três facilitadores convidados, que trouxeram abordagens complementares para enriquecer a formação. Laércio Meirelles, agrônomo e agroecologista, ministrou aulas sobre a “Organização Social da Produção e Territórios de Uso Comum” abordando a história dos movimentos sociais, o surgimento de associações, cooperativas e a importância das feiras no fortalecimento de organizações sociais. As feiras, segundo o professor Laércio, vão além de um simples espaço de comercialização:
“A feira não é só um espaço de venda, mas também de articulação social. É nela que encontramos nossos companheiros, conversamos sobre o que está acontecendo na roça, sobre acertos, erros e dificuldades… E a feira precisa de cuidado, viu? Feira que a gente não cuida tende a esmorecer”
Para ele, esses espaços são muito importantes na promoção da organização social, propícios ao fortalecimento comunitário e cooperação.
Gisele Ferreira, 19 anos, cursista do Formar Baru e membro do Centro de Produção, Pesquisa e Capacitação do Cerrado (Ceppec), compartilhou a sua visão:
“Muita gente me pergunta se eu tenho vergonha de ir para a feira… mas eu sinto o contrário. Eu amo. Eu tenho orgulho de ir para a feira, de trabalhar com alimentos saudáveis e de ajudar a preservar a natureza. Tenho muito orgulho do meu trabalho.”
Outros professores convidados foram Luis Carrazza, secretário executivo da Central do Cerrado, que conduziu uma aula prática sobre as boas práticas de manejo e o uso do baru, levando os participantes a um baruzal para demonstrar as etapas de coleta, beneficiamento e armazenamento do fruto.
Além disso, Flávia Aguiar, comunicadora, fundadora e locutora do programa Beira Mundo da Rádio Cultura, ofereceu uma oficina criativa de vídeos curtos, incentivando os participantes a contarem suas próprias histórias e tradições por meio da produção audiovisual. Essas contribuições somaram conhecimento técnico e cultural ao módulo, reforçando a conexão entre a prática, a gestão territorial e a valorização das identidades locais. A seguir, você poderá assistir a um pequeno vídeo produzido pelos cursistas do Formar Baru após a oficina com Flávia, mostrando algumas atividades da formação.
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Para ampliar o aprendizado, foram disponibilizados materiais didáticos sobre legislação, apelidados de ‘Sementes de Legislação’, abordando temas como a Política de Garantia de Preços Mínimos para Produtos da Sociobiodiversidade (PGPM-Bio), a Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (PNAPO), o Código Florestal e o papel das cooperativas no acesso a financiamentos, treinamentos e tecnologias. Além disso, foi criada a ‘Semente de Comunicação’, por meio da tenda do Serviço de Atendimento ao Baruzeiro (SAB), oferecendo suporte técnico aos cursistas com dificuldades no uso de celulares e outras tecnologias, garantindo que todos pudessem acessar plenamente as ferramentas digitais doadas pelo projeto.
Próximos Passos: Tempo-Comunidade e Ação Local
Após uma semana intensa de aprendizado, troca de saberes e construção coletiva de conhecimentos e documentos, os cursistas retornaram aos seus territórios para dar início ao “Tempo-Comunidade 2”. Nesse momento especial, eles terão a oportunidade de aplicar tudo o que aprenderam no módulo 2 da formação, realizando mutirões e outras atividades em suas comunidades. Com o suporte pedagógico e tecnológico do IEB, eles contarão com orientação e acompanhamento durante todo o processo. O objetivo é que se tornem disseminadores de conhecimento, promovendo mudanças positivas em suas localidades.
Alcileia Torres, 19 anos, comunicadora da Associação Quilombo Kalunga, compartilhou as suas expectativas para o futuro e para o tempo-comunidade:
“Eu vejo em 50 anos o nosso mercado kalunga funcionando. Comercializar os produtos do Cerrado ainda é algo novo, então o tempo-comunidade do Formar Baru é essencial para que possamos levar o que estamos aprendendo aqui sobre geração de renda e boas práticas do baru para os mais velhos e para aqueles que não estão presentes com a gente. Manter vivo esses sonhos em nós, jovens, é muito importante. Trabalhar com o que temos, com o que vem da natureza, e conseguir fazer como os nossos ancestrais, tirando nosso sustento da terra e ainda conseguindo gerar renda com isso. Só assim vamos conseguir combater a evasão escolar e a saída dos jovens dos territórios.”
Formação Continuada em Cadeias de Valor Inclusivas do Cerrado
O Formar Baru é uma formação continuada desenvolvida pelo IEB em parceria com a Associação Quilombo Kalunga e a CooperFrutos de Alto Paraíso, com o apoio do Fundo Global pelo Meio Ambiente (GEF) e do Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (FUNBIO). Conta também com a colaboração de representantes da Apromas Sertão, ISPN e da Central do Cerrado no comitê pedagógico.
Inserido no contexto do projeto “Cerrado em pé com geração de renda: a cadeia produtiva do baru como aliada da biodiversidade e dos povos tradicionais”, o objetivo da formação é promover a conservação e a geração de renda no Cerrado, tendo a castanha-do-baru como elemento chave. O programa é dividido em seis módulos presenciais, intercalados com atividades intermodulares, chamadas de “tempo comunidade”.
Durante os módulos, os participantes recebem apoio pedagógico, participam de oficinas, têm acesso a materiais didáticos e são orientados em temas como manejo sustentável, comercialização, desenvolvimento local e regional, gestão de negócios comunitários e repartição de benefícios econômicos. Para saber mais e acompanhar as próximas edições do Formar Baru, acompanhe o site e as redes sociais do IEB.
Texto: Camila Behrens/IEB