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Conhecer Paraty pelo olhar caiçara
Em Paraty, na Costa Verde do Rio de Janeiro, por meio do projeto Roteiro Integrado de Turismo de Base Comunitária na Península da Juatinga, os caiçaras, moradores tradicionais da região, passaram por um processo formativo para buscar maior protagonismo dentro do mercado de turismo local, ampliando as oportunidades de trabalho e de geração de renda. A iniciativa é promovida pelo Instituto Amigos da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica (IA-RBMA), com apoio do Projeto Educação Ambiental sob gestão do Fundo Brasileiro para Biodiversidade (FUNBIO). Os novos roteiros, elaborados pelos moradores, conectam visitantes às paisagens paradisíacas e às comunidades tradicionais. Mais de 350 pessoas foram beneficiadas diretamente.
Rafael dos Santos Oliveira, 29 anos, morador de Paraty Mirim, já trabalhava como condutor de barcos e agora pode atuar também como guia em terra. “Nos passeios de barco os visitantes já costumavam fazer muitas perguntas sobre as trilhas e pedir indicações de guias. O curso possibilitou a diversificação do nosso trabalho. Hoje posso oferecer a experiência completa, por água e terra”, destaca. Ele fala também sobre as amizades feitas ao longo das aulas. “No início, achamos que o curso seria muito longo. Foram semanas de muita dedicação. No fim, não queríamos que acabasse. Criamos uma relação com o grupo. Agora sabemos que seremos bem recebidos em toda a área costeira”, conta Rafael.
Após a formação, 80 moradores locais foram certificados pelo Instituto Estadual do Ambiente (INEA) para atuar como condutores ambientais na Reserva Ecológica Estadual da Juatinga (REEJ). Durante uma semana, de 15 a 21 de abril, parte do grupo fez uma caminhada pela reserva, acompanhados por representantes do INEA, para mapear e sinalizar a trilha da Travessia da Juatinga e passar por um estágio antes de estarem aptos para receber os turistas com os novos roteiros. A travessia tem cerca de 39 km de distância e leva de quatro a sete dias para ser realizada, passando por três Unidades de Conservação: a REEJ, a Área de Proteção Ambiental (APA) de Cairuçu e o Parque Nacional da Serra da Bocaina. A atividade reforçou também a boa relação entre as comunidades locais e os órgãos ambientais, essencial para conservação da natureza na região.
Identidade e pertencimento
Onze comunidades de Paraty fazem parte do roteiro caiçara: Trindade, Ponta Negra, Martins de Sá, Saco das Anchovas, Praia do Sono, Ponta da Juatinga, Pouso da Cajaíba, Saco do Mamanguá, Cairuçu das Pedras, Paraty Mirim e Laranjeiras. Cultura rica, saberes ancestrais, conhecimento da natureza, modos de vida simples e de baixo impacto ambiental são algumas das características que definem o que é ser caiçara. Nascidos perto do mar, resistem à atividade portuária, à especulação imobiliária, à urbanização e ao turismo predatório. Esses povos tradicionais, presentes nos litorais de Paraty e Angra dos Reis e dos estados de São Paulo e Paraná, desde o século XVIII, lutam para manter vivo seu estilo de vida e proteger os mares, manguezais e a Mata Atlântica. Tradicionalmente, vivem da pesca artesanal e da agricultura de subsistência.
Condutor ambiental formado há mais de 20 anos, Cauê Villela, 40 anos, é líder comunitário na Reserva da Juatinga, professor e coordenador local do projeto Roteiro Integrado de Turismo de Base Comunitária. Caiçara nativo de Ponta Negra, Cauê sabe a importância de manter vivo o conjunto de saberes, tradições, hábitos e costumes das comunidades tradicionais e atua para valorizar sua cultura e oferecer melhores condições e perspectivas para os moradores locais. Sua atuação na área já está rendendo frutos como a maior união das onze comunidades, que juntas sentem-se mais fortes para preservar seus territórios e modos de vida.
Para Yasmin Puchalski, 32 anos, participar da capacitação foi como uma virada de chave que uniu os moradores de cada região de Paraty. “A partir da convivência durante as aulas, nós passamos a ver as comunidades como um todo. Foi como uma quebra de barreiras. Hoje somos como irmãos e formamos uma grande rede de apoio”, ressalta. Juntos há 14 anos, Yasmin e Cauê hoje trabalham com roteiros na Ponta Negra, onde moram com a pequena Aurora, 3 anos, filha do casal.
Marcelly Mota, 28 anos, originária da Ilha do João Araújo, também aponta a união e a preservação das comunidades como pontos marcantes proporcionados pela iniciativa. Ela já atuava como guia de turismo formada e conta que participar da formação trouxe uma nova visão para seu trabalho e sobre o território. “Eu já tinha uma paixão especial pela Reserva da Juatinga e queria muito conhecer esse lado mais nativo. Entrar no curso me deu uma visão diferente de onde eu andava, a partir da conexão entre as comunidades. Hoje parece que faço parte de todas elas. Criei muitos laços e conheci, mais de perto, essa luta de todos para se manterem no território e como fazem para preservar o seu lugar. Criei um grande respeito por todos. E agora mostro aos meus clientes que eles não estão visitando só um atrativo, mas sim uma comunidade, a casa de alguém. Os visitantes passam a ter uma consciência mais forte em relação a preservação do lugar e criam uma empatia maior sobre todo o passeio”, relata Marcelly, que atualmente mora em Trindade.
Benefícios para quem mora na região e para quem a visita, que agora terá a oportunidade de conhecer a cultura caiçara contada e apresentada pelos moradores locais. Leia mais sobre a iniciativa aqui.