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Sementes da maricultura
A organização Lagos em Ação tem 16 anos de história. Mas já faz pelo menos três décadas que seus fundadores carregam a missão de fortalecer a maricultura na cidade de Arraial do Cabo, no Rio de Janeiro. Encerrando um ciclo de iniciativas apoiadas pelos projetos Educação Ambiental e Pesquisa Marinha e Pesqueira, a ONG deu passos importantes rumo a essa antiga meta: “Os projetos estão transformando não só a nossa comunidade, mas motivando outras famílias a serem também maricultoras”, diz Paulo Cordeiro, presidente e um dos fundadores da Lagos em Ação.
O ponto de virada inicial veio em 2022, quando a organização teve aprovada pelo Projeto Educação Ambiental a iniciativa Maricultura Multitrófica de Arraial do Cabo (MMAC). Foi dali que nasceu a primeira fazenda marinha da Lagos em Ação. E não era uma fazenda qualquer: o sistema de cultivo de moluscos, peixes e algas foi desenvolvido para ser ecologicamente equilibrado e de baixo impacto ambiental, transformando efluentes em nutrientes para o próprio consumo das espécies marinhas.
“O Paulo sempre foi envolvido com a maricultura, sabia de seus gargalos, das melhorias necessárias. E ali pela primeira vez conseguimos viabilizar uma fazenda marinha modelo, diferenciada e sustentável, como queríamos”, diz Murilo Marins, que tem 28 anos e atua nos projetos da Lagos em Ação.
Instalada em uma balsa flutuante, a fazenda já foi uma grande conquista, mas era apenas o prenúncio de algo maior: pouco tempo depois, a organização teve sua segunda iniciativa apoiada pelo FUNBIO, desta vez via Projeto Pesquisa Marinha e Pesqueira, em uma chamada focada no apoio à maricultura no estado do Rio de Janeiro. Maricultura Cabista: Desenvolvimento e Inovação tinha como objetivos não só aperfeiçoar a estrutura e a produção da fazenda marinha, como espalhar aquele modelo e fortalecer outras organizações e comunidades envolvidas com a maricultura na região.
“Hoje nossa fazenda tem captação de energia solar, captação de água da chuva, um sistema biodigestor e flutuadores reutilizados da indústria de petróleo”, enumera Murilo, ressaltando o pioneirismo dessas tecnologias em uma fazenda marinha.
Apesar de ainda estar em fase experimental, a produção mais do que triplicou – somente o sistema de cultivo de ostras teve sua capacidade aumentada de 2.400 dúzias para cerca de 8 mil. A intenção é abrir o local para visitação, agregando valor também com o turismo. E já que a missão é fortalecer o setor da maricultura, todo aquele conhecimento e prática não poderiam morrer ali: a Lagos em Ação trabalha junto a quatro instituições locais para desenvolver outras fazendas marinhas autossuficientes. Pelo menos uma delas já concluiu a construção de sua balsa de manejo.
“Não só viabilizamos a construção mas também fornecemos insumos da maricultura, como boias e sementes de ostras e vieiras, para começarem a produzir do zero”, diz Murilo. “Nosso compromisso é replicar o modelo que desenvolvemos aqui, oferecendo apoio técnico e logístico para a produção de outras instituições”.
É na troca, afinal, que a cadeia se fortalece. E por isso mesmo, a Lagos em Ação também promoveu discussões no Grupo de Trabalho da Maricultura da Reserva Extrativista Marinha do Arraial do Cabo, além de ações de intercâmbio com a Associação Livre de Maricultores de Jurujuba (ALMARJ), em Niterói, que é a maior produtora de mexilhão do estado do Rio de Janeiro (a ALMARJ também recebe apoio dos projetos Pesquisa Marinha e Educação Ambiental).
Com tantas frentes, a Lagos em Ação já é uma referência em maricultura na cidade de Arraial do Cabo. E um dos segredos desse reconhecimento é a capacidade que a organização tem de reunir os saberes acadêmicos e populares em seu corpo técnico. “É comum haver um distanciamento entre a academia e as comunidades. Mas aqui a gente busca promover o contrário, pois sabemos da importância que cada uma tem. Estamos sempre funcionando como uma ponte para o conhecimento”, diz Murilo.
O resultado não poderia ser diferente: inovação e tecnologias criativas para encontrar soluções locais. Como é o caso da fábrica de lanternas criada pela organização. “Chamamos de lanterna as estruturas onde a gente mantém as ostras e vieiras no mar para irem crescendo”, explica Murilo. “Cada uma delas custa em torno de R$ 200 e são necessárias cerca de 100 unidades. É um dos utensílios mais caros para a maricultura”, diz.
Com apoio da Fundação Instituto de Pesca do Estado do Rio de Janeiro (FIPERJ), a fábrica já está em funcionamento. Operada por mão de obra local e feminina, as lanternas são feitas artesanalmente com redes de pesca e pratos plásticos. “O custo sai bem mais barato e as mulheres recebem por cada lanterna produzida, fazendo o dinheiro circular nas comunidades de Arraial”, afirma Murilo.
Com o tempo, a ideia é que a fábrica forneça esses materiais para as futuras fazendas marinhas que ainda serão concretizadas na região. Afinal, se a iniciativa financiada pelo Projeto Pesquisa Marinha e Pesqueira está chegando ao fim, a missão da Lagos em Ação não tem hora para acabar: “A maricultura ainda é um setor pouco desenvolvido. Mas a gente sabe do enorme potencial que ele tem”, diz Murilo.