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Em parceria com o ARPA, ICMBio lança painel de monitoramento da biodiversidade brasileira
A Conferência das Nações Unidas para a Diversidade Biológica, a COP 16, , realizada em outubro deste ano em Cali, Colômbia, reconheceu oficialmente o papel das comunidades locais como agentes protagonistas da conservação, com a criação de um Órgão Subsidiário Permanente para Povos Indígenas e Afrodescendentes, que formaliza a ligação entre saberes tradicionais e ciência para fortalecer as práticas de preservação ambiental. No Brasil, que possui 20% de toda a biodiversidade do planeta, essa diretriz se alinha ao trabalho desenvolvido pelo Programa Monitora, do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), que completa uma década de atividades em 2024.
O Programa Monitora foi criado para acompanhar a saúde da biodiversidade nas Unidades de Conservação (UCs) brasileiras, com subprogramas dedicados a ecossistemas Terrestres, Aquáticos Continentais e Marinho Costeiros. O trabalho de monitoramento é de longa duração e envolve diversos organismos como: Coordenação de Monitoramento da Biodiversidade COMOB/CGPEQ e o Centro Nacional de Pesquisa e Conservação, além de instituições, pesquisadores, gestores de áreas protegidas e moradores das UCs. Desde o início, em 2014, o programa se destacou por integrar pescadores, povos da floresta e agricultores locais no levantamento de dados sobre fauna, flora e ecossistemas, o que proporciona ao ICMBio informações em tempo real, essenciais para embasar decisões de manejo e proteção ambiental.
No Pavilhão Brasil da COP16, O ICMBio, com apoio do FUNBIO, apresentou um painel on-line e interativo com resultados da última década de monitoramento, evidenciando a estabilidade populacional da grande maioria das espécies observadas em UCs federais. A apresentação também compartilhou novas ferramentas que ampliam a transparência e acesso público aos dados coletados, permitindo que qualquer cidadão acompanhe o estado da biodiversidade em tempo real. Desenvolvido com o apoio do Programa Áreas Protegidas da Amazônia (ARPA), o sistema ainda será aprimorado para incluir um módulo dedicado a espécies ameaçadas de extinção.
Conforme os dados, 161 populações de 49 espécies de aves e mamíferos foram analisadas, especialmente na Amazônia, com 92% das populações mostrando estabilidade e duas com tendências de crescimento. Cecília Cronemberger (CGPEQ), do ICMBio, afirma que o apoio do ARPA foi essencial para que essas UCs mantivessem uma coleta constante de dados, o que garantiu informações confiáveis para avaliações mais precisas. O levantamento também apontou um declínio populacional em 11 espécies. “São áreas onde devemos focar investigações para entender o que está ocorrendo”, complementa.
De acordo com Cecília, os dados confirmam a efetividade das UCs em conservar a biodiversidade, ao mesmo tempo em que ajudam a identificar áreas que necessitam de maior atenção e investigação. “É importante destacar que a maior parte das populações que conseguimos analisar, onde tínhamos um volume adequado de dados, vem das unidades de conservação que são apoiadas pelo programa ARPA. Essas unidades conseguiram manter coletas constantes de dados ao longo do tempo, o que possibilitou esse volume de informações”, explica a coordenadora.
Parceria ágil
O tempo recorde na conclusão do painel com resultados do monitoramento dos últimos dez anos e a rapidez na coleta e processamento dos dados foram destacadas por Rodrigo Jorge, da Diretoria de Pesquisa, Avaliação e Monitoramento da Biodiversidade (DIBIO), do ICMBio, que ressalta o apoio do ARPA no processo de contratação e o esforço de toda a equipe. “Com o apoio do ARPA, agradeço especialmente pela contratação em tempo recorde. Agora temos uma ferramenta com esses dados”, disse. O painel busca eliminar ou, pelo menos, reduzir o tempo entre a coleta e a disponibilização deles para o público.
Além da transparência, o novo painel será fundamental no processo de tomada de decisões para as UCs. Com base nos dados gerados, gestores ambientais poderão, por exemplo, identificar rapidamente ameaças emergentes e adotar medidas de manejo adequadas para proteger as espécies e os ecossistemas das unidades. “E quando os alertas forem gerados?”, questiona Rodrigo, refletindo sobre o papel da ferramenta na prevenção de ameaças à biodiversidade. “O painel irá auxiliar no processo de tomada de decisão, indicando, por exemplo, quais medidas de manejo podem ser adotadas a partir dessas informações”, aponta.
O modelo colaborativo adotado pelo Monitora, fortalece não apenas a proteção das espécies como também valoriza o papel dos moradores de comunidades locais na conservação da biodiversidade, alinhando-se às metas globais de preservação estipuladas no Marco Global Kunming-Montreal, que busca barrar ou diminuir 30% da perda da biodiversidade até 2030. Em 2024, o programa já está presente em 115 Unidades de Conservação, com 168 áreas terrestres, 24 aquáticas continentais e 34 marinhas costeiras. Por exemplo, no componente Terrestre Florestal, presente em grande parte na Amazônia, 57 Unidades de Conservação participam do Monitora com apoio do Arpa. Cerca de 74% das Unidades de Conservação que integram o Monitora fazem parte do ARPA. São 152 estações amostrais (EAs/UC) e 384 estações amostrais por alvo (EAs/alvo). No total, o programa possui 789 unidades amostrais instaladas e coletando dados.
“O apoio do ARPA foi fundamental, especialmente para as Unidades de Conservação da Amazônia, fornecendo estrutura para a implementação do programa de monitoramento. A primeira coleta de dados ocorreu em 2014, e agora, em 2024, celebramos dez anos de coleta de dados. Nesse período, houve um marco importante quando o ARPA adotou o Programa Monitora como referência, com seus protocolos desenvolvidos dentro do programa. Esse marco foi extremamente relevante, pois as Unidades de Conservação apoiadas pelo ARPA passaram a ter incentivo e estrutura para executar o monitoramento”, aponta Cecília.
Raimundo Façanha Guedes, gestor da Reserva Biológica do Tapirapé, no Pará, testemunha as transformações promovidas pelo programa em sua região. Para ele, o Monitora foi um divisor de águas na gestão da unidade, ao expandir a interação com as comunidades vizinhas. “Antes, a interação se limitava à educação ambiental. Com o Monitora, a comunidade teve a oportunidade de conhecer melhor o funcionamento da unidade e participar ativamente”, relata Façanha. A integração das comunidades ao redor das Unidades de Conservação (UCs) trouxe monitores comunitários para o projeto, incentivando o engajamento local em atividades de preservação.
A parceria financeira com a ARPA também foi essencial para o sucesso das iniciativas de monitoramento na área. “Para mim, foi uma experiência motivadora e enriquecedora, principalmente ao ver o impacto que causamos na vida das pessoas que agora participam diretamente das atividades de conservação,” destaca o gestor. Segundo ele, a Reserva Biológica do Tapirapé e outras áreas do Complexo de Carajás tornaram-se pontos de interesse para pesquisadores, fortalecendo a troca de conhecimentos entre gestores, cientistas e as comunidades.
Nova geração de monitores
Amanda Figueiredo, bióloga e ponto focal do Monitora Carajás, no Pará, reflete sobre a importância do programa para sua trajetória. “Eu conheci o Monitora inicialmente como monitora do programa. Fui para um desses projetos de pesquisa mencionados, com pesquisadores parceiros do programa, e lá tive meu primeiro contato com o Monitora. Fiz a capacitação e passei alguns bons anos como monitora atuando lá,” conta. Hoje, Amanda ocupa uma posição de liderança no programa, orientando novas gerações de monitores.
Para ela, o Monitora não só contribuiu para a biodiversidade local, mas também trouxe um crescimento pessoal e profissional. “O Monitora possibilitou um crescimento imenso na minha vida. Tenho certeza de que ele transforma a vida de muitas outras pessoas ao longo do país, pois é um programa vasto, cheio de possibilidades e muito importante, tanto para a biodiversidade quanto para as pessoas,” afirma. No campo, Amanda vivencia encontros únicos com a fauna local. “O pessoal até brinca que eu sou ‘pé frio’, porque vou para o campo e as onças não aparecem — sempre aparece toda a fauna ‘fofa’ quando estou lá,” comenta, rindo, ao lembrar dos esquilos, macacos e aves que cruzam seu caminho.
Além disso, o Monitora impulsionou a criação de novas oportunidades de capacitação, como a formação de monitores locais, integrando o conhecimento acadêmico e comunitário. Em uma das capacitações, Amanda envolveu alunos da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA) e lideranças locais, proporcionando à comunidade ao redor da UC uma aproximação com a conservação ambiental. Esse momento foi especialmente significativo para Amanda, que vê no programa não apenas uma chance de preservação ambiental, mas uma missão de vida.
Para Rodrigo Jorge, a conservação da biodiversidade só é efetiva quando feita em rede, de forma integrada. Ele também aponta a importância de manter o monitoramento contínuo ao longo do tempo, lembrando que a série temporal de dados do programa ainda é curta, mas que sua continuidade permitirá conclusões mais assertivas. “Temos uma série temporal relativamente longa em relação a outras iniciativas de monitoramento, mas ainda curta para conclusões definitivas. Por outro lado, temos agora a segurança de que essa série vai se estender, permitindo conclusões mais precisas no futuro”, afirmou Rodrigo enfatizando o valor da coleta constante de dados e a importância de manter a vigilância sobre os ecossistemas ao longo do tempo.
O coordenador ressalta a necessidade de incorporar inovações tecnológicas de maneira progressiva, sempre testando as metodologias em parceria com os gestores das UCs para garantir que cada avanço realmente contribua para o fortalecimento da proteção ambiental.
Apesar dos avanços, Rodrigo alertou para a necessidade de olhar para o futuro, considerando o rápido avanço das inovações tecnológicas no campo ambiental. “Estamos em um ponto em que o trabalho contínuo de coleta de dados nos permite alcançar as metas estabelecidas, mas é essencial olhar para o futuro e considerar as inovações que surgem a um ritmo acelerado”, disse. Para ele, a avaliação das tecnologias emergentes é crucial para fortalecer o que já foi implementado pelo programa.
O próximo passo do Programa Monitora envolve a integração dessas inovações, sempre em parceria com os gestores das Unidades de Conservação. De acordo com Rodrigo, será necessário testar as novas tecnologias e metodologias em colaboração com esses gestores, a fim de avaliar quais delas agregam valor ao programa. Com base nas avaliações, será elaborada uma estratégia para incorporar essas inovações nos próximos dez anos do programa, respondendo a questões cruciais, como: Quais iniciativas são mais promissoras? Onde serão realizadas as testagens? Quem serão os parceiros estratégicos? E, finalmente, quais recursos serão necessários para impulsionar essas melhorias? A ideia é criar uma trajetória sólida que combine o aprendizado adquirido ao longo da década com as inovações que podem potencializar a conservação da biodiversidade nas UCs brasileiras.
Como usar o painel de dados?
Ao iniciar a navegação disponível no gov.br, a primeira página do painel do Programa Monitora exibe informações sobre a implementação dos protocolos florestais até 2022, incluindo um mapa com todas as Unidades de Conservação (UCs) e dados gerais como biomas e UCs consolidadas. Gráficos mostram a evolução do programa, e é possível filtrar dados específicos de UCs, como a Resex Cazumbá-Iracema, visualizando registros anuais e o estado dos alvos (plantas, borboletas, mamíferos e aves) para facilitar a tomada de decisão. Uma tabela com todos os indicadores permite baixar dados para análises adicionais. Na seção “Sobre o painel”, há detalhes sobre as contribuições das pessoas e instituições envolvidas, destacando o papel das comunidades locais na coleta de dados.
O ARPA – Áreas Protegidas da Amazônia é um projeto do Governo do Brasil, coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima e tem o FUNBIO como gestor e executor financeiro. É financiado com recursos de doares internacionais e nacionais, entre eles o governo da Alemanha por meio do Banco de Desenvolvimento da Alemanha (KfW), o Global Environment Facility (GEF) por meio do Banco Mundial, a Fundação Gordon and Betty Moore, a AngloAmerican e o WWF.