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Expedições localizam frutos de árvore rara na Terra Indígena Kadiwéu no Pantanal
Duas expedições realizadas pela equipe técnica do projeto Estado de conservação, restauração ecológica e cadeia produtiva de espécies vegetais nativas de interesse indígena no Pantanal localizaram e coletaram pela primeira vez na Terra Indígena Kadiwéu frutos de uma árvore rara no Brasil, o pau-santo. Considerada ameaçada de extinção em outros países em decorrência do desmatamento, ainda não se sabe o grau de vulnerabilidade da espécie no território brasileiro.
As expedições partiram da aldeia Barro Preto, na Terra Indígena Kadiwéu, em Porto Murtinho (MS). A área protegida, que tem 539 mil hectares e seis aldeias e é a maior terra indígena do Mato Grosso do Sul, situa-se em uma zona de transição entre os biomas Cerrado e Pantanal.
Com o apoio e conhecimento da comunidade local, que foi junto à equipe da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), as missões encontraram áreas remotas em que ocorrem o pau-santo na terra indígena, contaram matrizes da planta e marcaram os pontos georeferenciais exatos em que se localizam, além de realizarem a coleta de sementes, raízes e estacas da espécie.
O pau-santo é de grande interesse pelo valor cultural que tem para o povo Kadiwéu. Árvore de casca grossa e crescimento lento, alcança até 18 metros de altura e tem madeira com perfume doce e agradável. Quando o galho é cozido, libera uma resina, que é usada para dar brilho preto e único no grafismo das cerâmicas elaboradas pelas mulheres do povo Kadiwéu.
“Temos que preservar o pau-santo para preservar as cerâmicas e o trabalho das [mulheres] ceramistas [de nosso povo Kadiwéu]”, destaca Silvana Derriune, presidente do viveiro Nialigui Libineningui (Mata Bonita), ao falar sobre a importância da planta para a manutenção da cultura local. O pau-santo tem o nome científico de Gonopterodendron sarmientoi. Na língua Kadiwéu, é chamado Elegigo.
O pau-santo foi encontrado em capões típicos do pantanal chaquenho. São áreas de 1 a 60 hectares de mata, com formato geralmente redondo, e que tem como bordas campos com zonas alagadas sazonalmente. Esses capões em que se encontrou o pau-santo ficam próximos de rios, que inundam na época de chuvas.
“Queremos entender como a espécie pode ser usada para ações de restauração pelos Kadiwéu. O projeto importa porque dá visibilidade a uma planta pouco valorizada, mas que é valiosíssima para a comunidade indígena. E é um projeto relevante para o Pantanal já que se tem pouca informação sobre restauração no bioma”, destaca a bióloga Letícia Couto Garcia, coordenadora do projeto e professora no Laboratório Ecologia da Intervenção (LEI) da UFMS.
O projeto pretende formar coletores e produtores de sementes e mudas de espécies nativas para o bioma Pantanal. Em oficina de restauração ecológica, realizada na aldeia Barro Preto, em setembro, em parceria com a Mulheres em Ação no Pantanal (Mupan)/Wetlands International, promoveu-se a troca de saberes científicos e tradicionais sobre coleta de mudas e sementes de espécies conhecidas do povo e outras de pouca informação, mas com potencial para restauração, como é o caso do pau-santo.
“Foi muito interessante porque não tínhamos conhecimento da planta. Aprendemos muito e com certeza vamos fazer o possível para que a semente evolua”, conta Carol Silva, professora da escola da aldeia Barro Preto que esteve em uma das expedições.
A ideia, agora, é reproduzir mudas perto das aldeias. A comunidade indígena de Barro Preto já testa, no viveiro criado com o apoio da Mupan/Wetlands International, a rebrota de raízes e galhos de pau-santo. O material foi coletado nas expedições para pesquisas de estaquia levantadas pelo LEI. A planta tem reprodução vegetativa. Do total de 70 sementes de pau-santo que foram coletadas, estão sendo realizados testes de germinação no laboratório. Até o momento, todos os experimentos vêm dando respostas positivas.
“Queremos desvendar o mistério do pau-santo e produzir muitas mudas dele. Quem sabe, os Kadiwéu poderão ter um viveiro de referência de uma planta rara no Pantanal”, projeta Letícia.